A Câmara Municipal de Luanda era um edifício imponente, com uma localização privilegiada sobre a Mutamba, o maior terminal de “Machimbombos” de África, da qual se destacavam duas linhas a n.º 4 para o Bairro de São Paulo e a n.º 17 para o Bairro da Cuca com terminus na Mabor.
Mas tinha uma coisa melhor, uma das melhores Bibliotecas de Angola, repleta de livros técnicos e de cultura geral. Tinha já na altura, horário alargado até às 24.00 Horas.
Mas, tinha ainda duas particularidades, um enorme Largo quadrangular defronte da fachada posterior e o Senhor Martins, zeloso funcionário Transmontano de Vinhais, que tinha tanto de largura como de altura.
O Senhor Martins nas suas rondas pela Biblioteca esforçava-se por entrelaçar os dedos por detrás das costas, mas não conseguia, os braços eram curtos. Mas era um tipo porreiro.
Quanto ao Largo, esse, obra de engenharia feita à nossa medida, servia de Pista de corridas do tipo Drag Race, logo após o toque da sineta de fecho da Biblioteca.
Junto a entrada principal posterior, alinhavam a Maxi Puch, conduzida por mim e a Kreidler vermelha, conduzida pelo Abílio ou a Kreidler preta conduzida pelo Gennaro Pugliese.
A corrida constava de 10 voltas ao Largo e quem chegasse primeiro ganhava e podia nas calmas saborear um Pão Quente com manteiga na Padaria das Ingombotas, quase ali ao lado.
A rivalidade entre as Puch’s e as Kreidler’s era enorme, era uma luta entre austríacos e alemães, mas por norma as Puch’s davam uma sova às Kreidler’s.
No arranque as Puch’s eram mais lentas, mas depois era prego a fundo durante as 10 voltas e recuperavam com grande avanço. O pior eram as quedas e foram algumas, mesmo muitas, porque as pedaleiras roçavam no chão e terra à vista.
As corridas ganharam nome e era ver o pessoal da Biblioteca depois do fecho a curtir o desafio, incluindo o Senhor Martins, que zelosamente retirava o seu Datsum 1200 do Parque de estacionamento para ver os Loucos de Luanda.
Mas, como tudo na vida, alguém se chibou e a PSP acabou com as Drag Race Made In Biblioteca.
A minha Maxi Puch fez milhares de Km’s em Grandes Viagens pelo Sul de Angola, carregada até aos dentes, na sua velocidade de cruzeiro de 40 Kms/hora. A minha Maxi Puch ensinou-me a apreciar o tempo e despertou o meu espírito de ventura.
Coisas da vida, podia dar para pior.
Inté.
PS: Pelas fotos vê-se que a Maxi Puch era uma gazela
Comentários
6 comentários a “PUCH VERSUS KREIDLER”
Excelente história.
Gostei bastante.
Venham mais.
Abraços
Tambem tenho muitas boas recordações com a “Maxi Puch” .
Gostei de ler a tua memória, que me levou tambem a relembrar situações muito bonitas passadas comigo.
Um Abraço
Inté
Realmente sou mais velhote!
Do tempo das Solex e depois NSU, ambas com muita necessidade de dar ao pedal para ajudar os motorzitos….
Imagine a beleza de ir de Vespa do Lubango a Quilengues, nas férias grandes de 1960, por aquela bela “autoestrada” de então.
Como o avançar da idade nos trás à memória as aventuras da nossa juventude, não é?!!!
E hoje temos medo de tudo e mais alguma coisa. Éramos loucos? Se calhar, se calhar.
Cumprimentos
Eduardo, sinceramente aquilo era aventura no seu estado mais puro.
Não havia a palavra medo, eu ia de Luanda a Moçamedes na minha Puch, eram mais de 1200 km só de ida. Quilengues, boa terra, passei por lá. Tundavala, Serra da Leba, uma das maiores obras de engenharia portuguesa, feita pelos Motas.
Os carangueijos da Baía Farta ou o Deserto do Namibe, enfim, vidas que nos fazem viver.
Abraço.
Boas,
é sempre uma delicia ler as memórias do Mestre.
Elas fazem parte de uma vida que foi vivida e “saboreada”. O tempo passa…bom sinal…ainda cá estamos…importante é sabê-lo aproveitar…as memórias são a prova disso mesmo…
Fiquem bem!
Também já tive essa experiência! (ter uma Maxi Puch) agora só lhe restam os documentos. Tenho esperança de encontrar uma um dia destes!
E nas corridas se pedalares bem, comes os tipos até no arranque