I EXPEDIÇÃO LISBOA A LUANDA EM TODO TERRENO – 1992 – FINAL

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Pois é.

Dia 2 de Abril de 1992

O que queriamos mesmo era chegar a Kidal. Para nós, Kidal era o paraíso.

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Saímos bem cedo do acampamento, pela calada da madrugada… penso que até os motores falavam baixinho, tal era o cagaço do 4ºassalto ou da liquidação total.

Partimos, e tal era a pressa que tomámos um rumo errado, o que nos levou a andar mais para a esquerda quando deveria ser um rumo mais a norte. Chegamos a Kidal, e toca de ir ao posto fronteiriço que, pasme-se, não era mais que um barraco em barro. Tinha uma mesa tosca e uma cadeira que não era mais do que um assento de um carro qualquer, mas na versão “só-com-molas”.

Depois de um bocado à espera, aparece um soldado com arma à cinta, todo ele em grande estilo: casaco camuflado, calções e chinelos. Sem problemas, carimba os passaportes e avisa-nos que a coluna militar que garante a segurança do pessoal até Gao sairia às 13.00 horas. A tempo estava quase a queimar, mas mesmo assim ainda deu tempo para beber uma Fanta numa espécie de mercearia.

Kidal era uma espécie de zona militar avançada. Parece que tinha um forte destacamento militar francês, pelo que vimos por umas instalações militares ao longe.

À hora certa, arrancámos em coluna militar, mas as “chaimites” – velhos carros de combate – paravam constantemente, porque aqueciam ou “pediam” óleo. Foi uma viagem lenta, com muitas paragens.

Depois de uma tarde em andamento, chegámos a uma aldeia, onde pernoitámos.

Os militares avançaram de armas em punho e roubaram alguma comida à população; foi uma triste cena, mas enfim, agora queriamos era chegar a Gao.

A determinada altura, um miúdo veio ter connosco a perguntar se não queriamos cabrito grelhado – o Zé Mota disse que sim. Não tardou muito tempo e lá apareceu uns nacos de carne grelhada numa bacia azul. Do azul da bacia de plástico só se via algumas zonas, tal era o sujo ou negro da mesma, mas a fome era tanta que alguém teve a ideia de mandar apagar a luz de trabalho de um dos carros… Quando esta se acendeu nem ossos havia. O que faz a fome…

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Dia 3 de Abril de 1992

Bem cedo, a coluna militar partiu – desta vez, com os Toyotas cheio de militares em posição de combate e as “chaimites” sempre em acção.

Fomos avisados pelo Comandante da coluna que iriamos entrar em zona de guerra e, como tal, poderíamos ser atacados.

Foi a hora mais longa das nossas vidas, já que éramos carne para canhão em cima daquele Mercedes. Uma angústia do caraças. Foi quando pensei que ia desta para melhor. Os militares faziam autênticos jogos de guerra, estavam atentos e em permanente posição de combate, numa zona em que nós e eles eramos os alvos fáceis, já que andávamos por entre montes.

Bem… chegámos ao asfalto e a um controlo militar: estávamos em Gao.

Fomos para um Parque de Campismo, onde recomeçaram os contactos com o Governo, nomeadamente com a Presidência. Ao fim da tarde ficámos a saber que um avião C130 nos iria buscar a Gao.

Dia 5 de Abril de 1992

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Não sei bem se foi a 5 ou a 6 de Abril – só sei que num dia desses ao fim da tarde -, ouvimos um ronco por cima de nós e lá estava ele: o C130 com a bandeira portuguesa na janela.

Fomos de imediato para a pista de aviação e lá estava o C130 rodeado de GOEs, armados até aos dentes.

Foi carregar o pessoal e um UMM e pouco depois bazar dali a todo o gás.

Sei que voámos mais de uma hora a baixa altitude e que nos deram uma boa refeição quente. Por volta das 7H00 do dia 5 ou 6 de Abril, estávamos a aterrar em Figo Maduro.

Eu, de calções (os mesmos com que fiquei do 1º assalto), com os óculos partidos e uma camisa preta emprestada pelo “altamente, man” – o meu amigo Luís Vasconcelos, que hoje é editor de fotografia da Revista Visão.

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Tinha a Rosa Maria o Nuno e o Rui em casa, à espera.

Os que não vieram connosco, foram para Bissau e tiveram muitos problemas: apanharam malária, foram roubados e tiveram outros azares.

Foi uma aventura “do caraças”, e que alguns não conseguiram ultrapassar, mas o meu espírito de aventura continua, daí o Desafio Namíbia 2009 estar em marcha.

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O mais importante ficou aqui registado, e há coisas de que nunca me esquecerei:

  • o cheiro e as cores do mercado de Al Hoceima,
  • o oásis de Gardhaia, o seu Parque de Campismo e as suas 5 cidades na cidade;
  • o pão os belos cacetinhos de trigo;
  • os jantares de alcachofas com manteiga, algures nas dunas;
  • de ter comprado um frasco de brilhantina em Ouargia;
  • de ter comprado o meu bloco de notas diário em Gardhaia;
  • de, após o 2º assalto, ter recusado  beber água pela garrafa que passava de meia em meia hora pelo pessoal- mas quando a sede apertou, perdi os receios;
  • de ter saboreado aquela espécie de cabrito no escuro da noite já perto de Gao;
  • da viagem de canoa pelo Rio Niger, enquanto aguardávamos pelo avião;
  • do sabor das espetadas em Gao, pese embora a carne ser vendida na rua ao natural;
  • dos duches quentes em Gao, com água de tambor super aquecida pelo sol;
  • da imponência do Rio Niger e do volume do seu comércio;
  • de os homens andarem sempre de mão dada na rua;
  • do ronco do Hércules C130 sobre o parque de campismo;
  • dos nossos GOEs em posição de combate a volta do Hércules;
  • da cor da nossa bandeira;
  • do cantar dos parabéns ao Hélder Oliveira em plena viagem de C130;
  • da chegada a Figo Maduro e do cheiro de Portugal.

Para terminar, um agradecimento especial ao Doutor Mário Soares, Presidente da Repúplica na altura, pelo esforço diplomático que fez para chegarmos em segurança e por disponibilizar o Hércules C130. Um agradecimento, também, ao Doutor António Tânger, pelo empenhamento desde a primeira hora – desde a partida de Belém da nossa Expedição, até ao momento em que nos foram buscar a Gao.

Fico a dever esta a PORTUGAL.

Ao João Moutinho e ao Zé Mota, estejam onde estiverem, estarão sempre presentes na minha memória e amizade.

Antes do fim, o resto que fica para contar terá um FIM.

Gosto muito dos meus AMIGOS. Tenho muito ORGULHO neles.

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Comentários

4 comentários a “I EXPEDIÇÃO LISBOA A LUANDA EM TODO TERRENO – 1992 – FINAL”

  1. Só me ocorre uma coisa… “Homens de tomates”

    Parabens pela história que dava um bom filme.
    Abraço

  2. Avatar de Luís Câmara
    Luís Câmara

    Há Grandes coincidências! O cancelamento do Dakar fez nos revisitar os acontecimentos de há 16 anos. Hoje havia logo de encontrar o Rui Cardoso do Expresso que já não via desde então e tivémos a relembrar algumas das pessoas que viveram esta Aventura e de alguns reencontros extraordinários desde então ocorridos entre eles. Falou-me deste blog.Pois é, eu viajei também no camião; Ficou o Sonho, a Frustração, mas também a grande Sede de outros desafios!Foi um prazer revisitar essa Viagem(de uma Vida!)através dos seus relatos e c/ consternação saber da morte do João Moutinho, essa Grande Figura da Expedição! Seria fantástico reunir esse Grupo um dia e ter o Livro do João Moutinho nas mãos e quem sabe o Guião para um Filme que um dos N/ companheiros do camião – o Mason (o Americano)- sonhava um dia vir a fazer! Até Lá; Até sempre! Um grande Abraço!

  3. Olá

    Quero ver esses recortes, ler esses comentarios…
    Qual é o livro do João Moutinho?
    Abraços

  4. Boas.
    Tenho tudo cá em casa. Tudo que é jornal, notícia, até o Diário do Minho, apanhei sem querer em Braga.
    Inté.